A proposta de reforma
trabalhista que está sendo desenhada pelo Palácio do Planalto prevê a
flexibilização de direitos assegurados aos trabalhadores no artigo 7º da
Constituição Federal - que abrange um conjunto de 34 itens - desde que mediante
negociações coletivas. Segundo um interlocutor, a ideia é listar tudo o que
pode ser negociado para evitar que os acordos que vierem a ser firmados por
sindicatos e empresas após a mudança nas regras possam ser derrubados pelos
juízes do trabalho.
Farão parte dessa lista os
direitos que a própria Constituição já permite flexibilizar em acordos
coletivos como jornada de trabalho (oito horas diárias e 44 semanais), jornada
de seis horas para trabalho ininterrupto, banco de horas, redução de salário,
participação nos lucros e resultados e aqueles que a Carta Magna trata apenas
de forma geral e foram regulamentados na Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT). Estão neste grupo, férias, 13º salário, adicional noturno e de
insalubridade, salário mínimo, licença-paternidade, auxílio-creche, descanso
semanal remunerado e FGTS.
Já a remuneração da hora
extra, de 50% acima da hora normal, por exemplo, não poderá ser reduzida porque
o percentual está fixado na Constituição; licença-maternidade de 120 dias e o
aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo de no mínimo 30 dias
também. Para mexer nesses direitos, é preciso aprovar uma Proposta de Emenda à
Constitucional (PEC) - o que seria uma batalha campal no Congresso. Outros
direitos como seguro-desemprego e salário-família, citados no artigo 7º, são
considerados previdenciários e não trabalhistas e por isso, não poderiam entrar
nas negociações.
Na prática, tudo o que
estiver na CLT poderá ser alvo de negociação. Há muitos penduricalhos que não
aparecem na Constituição e são motivos de reclamações contantes, como por
exemplo, o descanso para almoço de uma hora (se o empregado quiser reduzir o
tempo e sair mais cedo, a lei não permite). Outros casos que poderiam ser
acordados dizem respeito à situações em que o funcionário fica à disposição dos
patrão, fora do expediente sem ser acionado e o tempo gasto em deslocamentos
quando a empresa busca os trabalhadores - considerados hoje como hora extra.
SINDICATOS QUEREM MAIS PODER
DE NEGOCIAÇÃO
A estratégia do governo é
colocar na lei tudo o que pode ser negociado e deixar de fora o que não pode
para evitar que a justiça trabalhista amplie a relação com novos direitos,
inviabilizando assim qualquer acordo, explicou um técnico. Fortalecer a
negociação coletiva é outro argumento do Executivo, diante de inúmeros casos em
que o sindicatos e empresas fecham o acerto e depois os juízes do trabalho
anulam, determinado o cumprimento da lei ao pé na letra e pagamento de
indenizações.
- O projeto vai delimitar os
parâmetros e limites da negociação coletiva, dando aos acordos força de lei. O
foco é oferecer segurança jurídica na relação capital e trabalho - disse ao
GLOBO o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, que está discutindo o tema com
as centrais sindicais.
Reforma trabalhista: saiba o
que pode ou não ser mudado
Por que a reforma é necessária?
O governo alega que a CLT,
dos anos 1940, precisa ser atualizada por não conseguir atender a todos os
setores da economia, como o de tecnologia, por exemplo, que passa por
constantes transformações. Outro motivo é que foram incorporados vários
penduricalhos às leis, que geram interpretações divergentes e estimulam
disputas judiciais.
Segundo ele, a questão já
está bem encaminhada com consensos importantes: para fechar acordos é preciso aumentar
o poder de negociação dos sindicatos, o que exige uma miniirreforma sindical,
junto com a flexibilização da CLT. As centrais defendem que a proposta inclua a
representação sindical no local de trabalho; o reconhecimento da autoridade do
delegado sindical para fazer a mediação de conflitos e a livre sindicalização
dos funcionários. Outro pleito é que somente entidades com representatividade
(determinado percentual de associados) possam fechar acordos - que terão ser
validados por assembleias de trabalhadores.
O secretário-geral da Força
Sindical, João Carlos Gonçalves (o Juruna), disse que as centrais não vão se
colocar contra à reforma, desde que a proposta seja pautada pelo fortalecimento
da negociação coletiva. Ele destacou que em outros países não existe uma CLT
como no Brasil, apenas uma legislação básica. Mas, isso não impede uma boa
relação entre capital e trabalho, explicou, porque os acordos coletivos
realmente funcionam.
- Aqui, tanto empresas
quanto sindicatos terão que rever suas posições. As empresas vêem os sindicatos
como inimigos e os sindicatos, por sua vez, terão que sair da inércia, ser mais
atuantes para fechar os acordos - disse Juruna, citando como um bom exemplo a
negociação do reajuste salarial dos bancários realizada em âmbito nacional,
juntando funcionários de bancos públicos e privados.
Para o secretário-nacional da CUT, Sérgio Nobre, somente há negociação quando as forças são equilibradas. Ele reafirmou que a entidade vai negociar a reforma trabalhista com o governo depois do desfecho do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff. Contrariando a posição da entidade até então, Nobre disse que a CUT "não nasceu para defender governo", mas os trabalhadores brasileiros.
Para o secretário-nacional da CUT, Sérgio Nobre, somente há negociação quando as forças são equilibradas. Ele reafirmou que a entidade vai negociar a reforma trabalhista com o governo depois do desfecho do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff. Contrariando a posição da entidade até então, Nobre disse que a CUT "não nasceu para defender governo", mas os trabalhadores brasileiros.
- Se o empresário pode tudo,
ele não vai negociar. Para quê? É preciso criar condições para que os acordos
aconteçam - disse Nobre, acrescentando: - Se a negociação coletiva existir de
fato, o Estado não precisa intervir na relação entre trabalhadores e empresas.
A União Geral dos
Trabalhadores (UGT), realiza na próxima semana uma reunião de âmbito nacional
sobre o tema e a tendência da entidade é apoiar a reforma trabalhista. As
maiores centrais já estão costurando um posicionamento conjunto para ser
apresentado ao governo.
- Nós apoiamos, desde que a reforma venha amarrada com a valorização do acordo coletivo para evitar a precarização dos direitos dos trabalhadores - disse o presidente da Central, Ricardo Patah.
- Nós apoiamos, desde que a reforma venha amarrada com a valorização do acordo coletivo para evitar a precarização dos direitos dos trabalhadores - disse o presidente da Central, Ricardo Patah.
OBJETIVO DA CLT É ‘TUTELAR O
MAIS FRACO’
Para o professor da
Faculdade de Economia Administração e Contabilidade (FEA/USP), José Pastore, o
pleito das centrais é legitimo e deveria ser incluído na Constituição para
evitar que os acordos realizados sejam anulados pela Justiça. Ele, no entanto,
vê polêmica na representação sindical no local de trabalho porque muitas
empresas são contrárias. Na visão do consultor da comissão de orçamento da
Câmara dos Deputados, Leonardo Rolim, as medidas sugeridas podem ajudar na
aprovação na reforma, no sentido de evitar que sindicatos de fachada façam
acordos prejudiciais aos trabalhadores.
- Acho que faltou isso na proposta de reforma de flexibilização da CLT enviada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (que foi engavetada no Senado) - disse Rolim, que fazia parte do governo à época.
- Acho que faltou isso na proposta de reforma de flexibilização da CLT enviada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (que foi engavetada no Senado) - disse Rolim, que fazia parte do governo à época.
O tema divide o atual
governo. Há quem defenda que a reforma valha apenas para os trabalhadores que
ganham salários mais altos (acima de três salários mínimos). Outros, apenas uma
modernização da CLT, sem mexer com direitos, como férias e 13° salário, por
exemplo. No Planalto, a visão é mais radical na linha de que o acordado possa
prevalecer sobre o legislado.
O procurador-geral do
Trabalho, Ronaldo Fleury, disse que, ao contrário do que se fala, a CLT vem
sendo atualizada ao longo dos últimos anos, apesar de ter sido criada na década
de 40. Segundo ele, assim como ocorre com a maioria dos países, a legislação
trabalhista brasileira tem por objetivo "tutelar o mais fraco".
- A negociação sobre o legislativo é algo perigoso. Quando vemos, na imprensa, um movimento para reduzir o horário de almoço para quinze minutos, alegando que é mais do que suficiente... Ora, biologicamente, quando a pessoa acaba de comer, vem o sono. Há a indução ao sono, que é própria do processo digestivo. Imagine se esse trabalhador que acabou de comer vai operar um guindaste. Ele come rápido, volta, sobe numa máquina e opera um guindaste de 40 toneladas - afirmou. - As empresas querem produção. Para produzir, ela tem duas opções, ou contrata mais ou exige mais dos trabalhadores.
Fleury defendeu a reforma do atual sistema sindical. Uma de suas propostas é permitir que os trabalhadores brasileiros possam escolher os sindicatos que melhor os representem.
- A negociação sobre o legislativo é algo perigoso. Quando vemos, na imprensa, um movimento para reduzir o horário de almoço para quinze minutos, alegando que é mais do que suficiente... Ora, biologicamente, quando a pessoa acaba de comer, vem o sono. Há a indução ao sono, que é própria do processo digestivo. Imagine se esse trabalhador que acabou de comer vai operar um guindaste. Ele come rápido, volta, sobe numa máquina e opera um guindaste de 40 toneladas - afirmou. - As empresas querem produção. Para produzir, ela tem duas opções, ou contrata mais ou exige mais dos trabalhadores.
Fleury defendeu a reforma do atual sistema sindical. Uma de suas propostas é permitir que os trabalhadores brasileiros possam escolher os sindicatos que melhor os representem.
- É preciso acabar com a
reserva de mercado. Por que, por exemplo, o jornalista só pode ter um sindicato?
- perguntou.
O Globo
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