O Programa de Promoção
da Igualdade de Gênero e Raça no Mundo do Trabalho, do Escritório da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, divulgou o quinto
boletim de atividades, que traz entre os destaques as atividades de cooperação
entre os escritórios da OIT em Brasília, Lisboa, Angola e Maputo para promoção
da igualdade de gênero.
Em artigo especialmente
elaborado para o boletim, a coordenadora do Programa de Promoção da Igualdade
de Gênero e Raça no Mundo do Trabalho da OIT, Ana Carolina Querino, discute a
importância da adoção da Convenção nº 189 e da promulgação da Emenda Constitucional
nº 72 para as trabalhadoras domésticas e para a democracia no país.
Leia abaixo o artigo
Tempo
de mudanças
Sabemos que uma
sociedade verdadeiramente democrática não é aquela que se estrutura a partir de
grandes - e injustificadas - desigualdades sociais, como o são as desigualdades
de gênero e étnico-raciais. Atualmente, estas podem ser consideradas um dos principais
entraves para a consolidação democrática nos países latino-americanos em geral,
e no Brasil em particular.
A existência de
instituições, tais como: partidos políticos, eleições periódicas, divisão de
poderes, garantia de liberdades no pensar e no se expressar, dentre outras, são
fundamentais para começarmos a democracia, mas não suficientes. Democracias com
D maiúsculo dependem também da capacidade dos Estados de promover e manter o
bem estar de seus cidadãos e cidadãs e, assim, contribuir de maneira definitiva
para uma justiça social efetiva. Para isto, são estratégicas ações que visem
gerar mudanças culturais, desarticulando instituições informais relacionadas a
práticas que contrariam os princípios básicos de direitos humanos e promovendo
o reequilíbrio de poderes.
Neste sentido, as
questões que permeiam o trabalho doméstico remunerado ganham centralidade. Em
levantamento realizado pela OIT em 117 países, o Brasil é, em termos numéricos,
o que possui mais pessoas ocupadas no trabalho doméstico remunerado. Dentre estas
pessoas, mais de 90% são mulheres e mais de 60% são mulheres negras. É
reconhecidamente uma das principais heranças das relações de trabalho do
período escravista e onde se manifesta de forma particular as relações cordiais
que camuflam uma série de ideias preconcebidas em relação ao trabalho
desenvolvido no âmbito doméstico, de uma forma geral, e por pessoas negras,
especificamente. Apesar de ser uma profissão que contribui de forma definitiva
para o desenvolvimento do país, para a geração de riquezas e para a reprodução
social, o reconhecimento de seu valor ainda depende de profundas mudanças
culturais e nas relações humanas.
A boa notícia é que o
tempo de mudança já chegou. Primeiro, celebramos a Tempo de mudanças adoção da
Convenção nº 189 e da Recomendação nº 201 sobre Trabalho Decente para
Trabalhadores e Trabalhadoras Domésticas durante a 100ª reunião da Conferência
Internacional do Trabalho, realizada em junho de 2011 em Genebra. E no dia 2 de
abril deste ano, ficamos mais uma vez em clima de festa devido à promulgação da
Emenda Constitucional nº 72 pelo Congresso brasileiro: emenda que equipara os
direitos das trabalhadoras domésticas com os das demais categorias de
trabalhadores e trabalhadoras, resgatando uma dívida histórica com as trabalhadoras
domésticas. Com a aprovação desta emenda constitucional, o Brasil deu um passo
significativo em direção à promoção dos direitos humanos e trabalhistas para
aproximadamente 6,6 milhões de pessoas e, por conseguinte, rumo à promoção da
justiça social e ao aprofundamento de sua democracia.
No entanto, são estes
dois grandes avanços legais suficientes para promover o trabalho decente para
trabalhadores e trabalhadoras domésticas? Ainda não. Eles são o ponto de
partida. Os instrumentos necessários para demarcar um ponto de virada muito
importante. Ponto este que vem sendo batalhado por diversas mulheres guerreiras
que ganham a vida com a renda do trabalho doméstico desde os tempos de
Laudelina de Campos Melo, lá pelos idos dos anos 30 do século passado. Mas
sabemos que as leis, por si só, não geram as mudanças comportamentais e de
valores necessárias para concretizar o que diz a letra. É preciso difundir
informações realistas e de qualidade, promover ações capazes de desconstruir os
estereótipos relacionados com o valor do trabalho doméstico e desenvolver
mecanismos que estimulem o cumprimento da lei.
Independente do desafio
que permanece, devemos celebrar este momento. Este tempo de mudanças que
permitirá que as futuras gerações experimentem outras formas de se colocar no
mundo, de se relacionar com o próximo e que vivenciem outros balanços de poder.
Que nossas futuras gerações vivam em um mundo com maior equidade de gênero e
raça.
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