O termo é relativamente
novo e ainda desconhecido por muitos. Defendida por uns, combatida por outros,
a CLT-Flex nada mais é que a abreviação de CLT Flexível, que, diga-se de
passagem, não existe no mundo jurídico. Na prática, surgiu entre os profissionais
da Tecnologia da Informação, mas o termo "pegou" e vem se tornando modismo no
mundo do trabalho como uma alternativa às normas trabalhistas.
Funciona assim:
ao "adotar" a CLT-Flex, o empregador propõe ao empregado um tipo
diferente de contrato, em que este aceita receber apenas de 40% a 60% do
salário ajustado, de acordo com a CLT, com a devida anotação na carteira de
trabalho. E é sobre esse montante que irão incidir os tributos sobre a folha de
pagamento e o imposto de renda. O percentual restante é quitado por fora e
descrito no contracheque como algum benefício, reembolso de despesas, bolsa de
estudos, planos de saúde, previdência privada, entre outros. Sobre essas
parcelas não recaem encargos trabalhistas e previdenciários.
Os que defendem a
CLT-Flex se inspiram no artigo 458 da CLT, que confere natureza indenizatória
às utilidades concedidas pelo empregador, tais como vestuário, educação,
assistência médica, seguros de vida e as demais listadas no próprio
dispositivo. Em outras palavras, a empresa dá uma interpretação extensiva ao
artigo em questão, visando à não incidência de tributos sobre percentual pago
ao trabalhador, para gastar menos e aumentar seu lucro. Quem combate a
flexibilização da CLT sustenta que, apesar de o empregado pagar menos imposto
de renda (às vezes até caindo na faixa de isenção), essa aparente vantagem
acaba sendo bastante prejudicial, porque o trabalhador perde em FGTS, 13º
salário e férias. Tudo não passa de ilusão e de uma grande fraude à legislação
do trabalho.
Os processos envolvendo
essa matéria têm sido cada vez mais frequentes na Justiça do Trabalho e um
deles foi analisado pela juíza substituta Solange Barbosa de Castro Coura, em
atuação na 40ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. O empregado alegou que, em
sua contratação, a empresa acertou que adotaria o sistema conhecido como
CLT-Flex. E assim, efetivamente, ocorreu. Recebia salário fixo e outros valores
descritos nos holerites como cota utilidade. A princípio, a empregadora
informou a ele que bastava apresentar recibos de despesas pessoais, como conta
de celular e estacionamento, para que fosse ressarcido de todos os gastos.
Rompido o contrato, a rescisão contratual foi calculada apenas sobre o salário
fixo. Apesar de a empresa ter negado a utilização da CLT-Flex, a magistrada
constatou que quem está falando a verdade é o trabalhador.
A juíza sentenciante
observou que, nas folhas de pagamento do trabalhador, consta sempre a parcela
"cota utilidade", sobre a qual não incidia FGTS, INSS, nem imposto de
renda. E, de acordo com a julgadora, não se trata de um caso típico de
pagamento de salário por fora, na forma conhecida no meio trabalhista. Isso
porque a empresa formalizou a quitação, mas atribuiu à verba registrada no
contracheque natureza não salarial. Outro dado que chamou a atenção da
magistrada foi a uniformidade dos valores. Da admissão até setembro de 2008, o
reclamante recebeu, por mês, a quantia de R$1.861,47. Já de outubro de 2008 a
setembro de 2009, R$2.002,94, mensais e, de outubro de 2009 até a data da
dispensa, R$2.113,10, também a cada mês. Além de os valores serem sempre os
mesmos, o aumento das supostas despesas ocorria sempre na mesma data, de ano em
ano.
O preposto da empresa
declarou que o empregado recebia salário fixo, registrado na CTPS, e a empresa
reembolsava os gastos que ele tinha com saúde, educação, plano odontológico e
previdência privada, desde que apresentasse os recibos. Garantiu, ainda, que os
valores mensais existentes no contracheque somente foram quitados após a
apresentação dos comprovantes de gastos. Segundo a julgadora, não haveria
razão, então, para a reclamada não apresentar os recibos, desatendendo à
intimação do Juízo. "Contudo como, apesar da negativa, a empresa
efetivamente adotou o sistema conhecido por CLT-Flex, simplesmente não pode
juntar os comprovantes das despesas mensais do autor, despesas essas que,
segundo o depoimento do preposto, condicionavam o recebimento da cota
utilidade" , frisou. Até porque, como afirmou o trabalhador em seu
depoimento pessoal e também a testemunha por ele indicada, independente da
entrega dos recibos, a cota utilidade era quitada mensalmente. E os recibos
eram pegos até nas lixeiras de postos de gasolina. Qualquer um servia. E as
notinhas poderiam se referir a despesas pessoais, sem nenhuma relação com o
trabalho. Nada era questionado.
Para a julgadora, não
há dúvida, a cota utilidade era paga todos os meses, em valor invariável,
independente da comprovação das despesas que justificariam o pagamento, sendo
aumentada anualmente. E a parcela era quitada, não para viabilizar o trabalho,
mas em razão do trabalho realizado na empresa. Por isso, a conclusão da juíza
foi de que o expediente adotado pela reclamada teve como objetivo apenas
fraudar a aplicação dos direitos trabalhistas. Nesse contexto, a juíza
reconheceu a natureza salarial da parcela cota utilidade, nos valores
registrados nas folhas de pagamento, e condenou a empregadora a pagar os
reflexos da verba em férias com 1/3, 13º salários, FGTS e Participação nos
Lucros e Resultados. A empresa foi condenada, ainda, a retificar a CTPS do
empregado. A ré apresentou recurso ao TRT da 3ª Região, que não chegou a ser
conhecido, por irregularidade de representação.
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